No dia 7 de julho, ganhei um cajado, ele era delicado, frágil, não muito simpático, mas aparentava força! Passaram muitos na minha mão, mas um parou, uma moça do meu lado, pediu para trocar, e na hora que peguei o outro, senti que aquele era o meu, e ela a mesma coisa!

Me disseram que o nome dele seria soprado, achei legal, mas a cabeça estava longe!

Fato foi que guardei o cavalo no carro, com medo de quebra-lo, levaria meus bastões!

Foram 7 dias de caminhada, e no meio, sempre lembravam que do nome, vi pessoas lamentando o cavalo, agora quebrado, dinâmicas com os cajados, e eu ali, com os bastões.

Falaram, depois, que a ideia dos cajados, era que o cuidado com o cavalo, refletia o cuidado conosco! Pensei que havia acertado ao guarda-lo, mas perdi a oportunidade de cuidar dele na rotina, como se precisássemos guardar as coisas importantes! Era o contrário, cuidado, carinho, devem ser usados em abundância com nós mesmos e com os outros, o tempo todo! Arrependia de o ter guardado!

Durante a caminhada, me vi impaciente, as vezes amargo, triste, lamuriando, e era algo que eu não compreendia, fazia o que gostava, aonde amo estar, com pessoas que gostam da mesma coisa que eu, porque isso?!

Enfim chegava o dia de despedir, voltar para casa, todos mexidos e eu, de alguma forma distante, queria casa. Mas entre eu e minha casa, havia 400 km de terra até Brasília, que inicialmente, faria em 2 dias, mas já cogitava fazer em uma pernada só, queria casa. Descansei na Chapada Gaúcha, um dia, e na terça-feira zarpei para Brasilia!

Cheguei, um susto, o carro falhou, mas era coisa atoa, e pude chegar em Brasília em segurança! Assustado e cansado! Descansei no dia seguinte, me organizei um pouco, haveriam compromissos no dia seguinte por lá!

Saí com as malas no carro, queria casa, encerrei as 11h30 e fui para estrada, almoçaria no caminho, mais perto de casa! Afinal, completavam 48 dias longe de casa!

Dormi em Andrequicé, era 19h30, estava cansado, e queria um colo, sabia que lá teria!

Acordei cedo no dia seguinte, queria almoçar com minha mãe na fazenda, e seguir para casa, lavar minha roupa, minha mala era a mesma há 49 dias já! Lavei ela várias vezes, ora na mão, ora na maquina, ora no rio, ora no tanque, ora era só tirar o sal, ora não tinha solução.

Enfim, cheguei em casa, escondido, na sexta a noite, era 20h. Não contei a ninguém, queria me esconder em casa!

Tinha feito a feira em Curvelo, foi só subir as escadas!

Ao subir, trouxe o cavalo, agora embrulhado para a viagem de carro para casa! Ao abrir, fiquei olhando ele, com carinho, estávamos em casa, em segurança. Ele ainda sem nome, limpo, guardado, na segurança do lar, que sem cuidado, não tem garantia alguma! E ele poderia quebrar, sem antes eu entender o que ele poderia significar para mim!

Pois bem, ao chegar no banheiro, de frente ao espelho, me vi magro, e pude perceber tudo que fiz desde o dia que me olhei no mesmo espelho e me despedi de casa, e de mim mesmo, sabia que muito mudaria, não sabia o que, nem como, nem nada, mas saberia que voltaria diferente!

Respirei fundo e soltei Que Saga!

Na hora pensei, durante os últimos 50 dias, percorri o caminho que inspirou Guimaraes Rosa 3x, com mais de 40 pessoas diferentes, depois embarquei por 7 dias desbravando uma rota entre duas rotas que tinha vontade de juntar, o Caminhos de Rosa e o Caminho do Sertão. Percorri o Caminho do Sertão por 7 dias, com mais de 100 pessoas. Uma jornada que me tirou da zona de conforto, tentei ser o meu melhor, mas esqueci de tudo que já tinha passado nos últimos dias!

A saudade e o cansaço, tiravam um pouco da minha alegria! A paciência era pouca, e o desafio enorme, por sorte, o desafio era lindo, gostoso e muito aconchegante! Mas nem por isso era fácil! Pelo contrário!

 Depois segui para a capital Federal, e enfim, casa, 50 dias depois!

No caminho de casa, vinha refletindo, sobre o que fazer com tanto sentimento, tanta experiência, tanta beleza, cansaço, realização, saudade. Sabe, acredito que esses caminhos mexem conosco de verdade, muito, vinha me perguntando como eu ainda não tinha desabado com tanta carga!? Para onde iria tudo isso, porque se eu guardar tudo isso, eu não suportaria! Precisa ser compartilhado! Ou eu me tornaria mecânico demais, algo que me mataria por dentro!

Depois do banheiro percebi, que depois de muito tempo, algo me contagiou, algo que vale a pena fazer, compartilhar! Algo que me desafia, algo que me faz ter brilhos nos olhos, como atleta, como pessoa, algo que me faz sentir vivo, um desafio que vale a pena ser vivido.

Percebi, na hora que soltei o suspiro, que essa seria apenas o primeiro passo de uma jornada que está apenas começando!

Meu cavalo chama Sagarana.

Aprendi muito nos últimos dias! Aprendi, que o nome Sagarana, tem sua origem hibrida:

“saga”, radical de origem germânica que significa “canto heroico”, “lenda”; e “rana”, palavra de origem tupi que significa “que exprime semelhança “. Assim Sagarana significa algo como “próximo a uma saga”.

Quem me ensinou foi o Almir Paracas! Ele e a Marta me ensinaram sobre reencontros, ao acaso, sobre amor e carinho, que carinho e cuidado não são intangíveis! O coletivo, que organiza o Caminho do Sertão expandiu isso, e deu a nós, a oportunidade, de tornar palpável esse carinho, eles coloriram as páginas do Grande Sertão, com carinho, e aconchego!

Nos ensinaram, que o que fazemos, faz o mundo! Que quando damos um passo, o mundo sai do lugar, acreditamos nisso, e toda vez que dávamos um passo, vários ao mesmo tempo, não éramos mais os mesmos, nem com nós mesmos!

Cheguei em casa com tudo isso, e certo de que essa foi apenas a primeira Saga, de algo que vai sair do sertão e mostrar ao mundo, que o amor, e carinho, estão nos nossos olhos, e que mesmo diante de toda dificuldade, o que fazemos, diz mais sobre nós do que as coisas que falamos, e que o belo, o carinho, nossas percepções somos nós que escolhemos!

SagaTupã, poderia ser este o nome, como se essa fosse apenas a primeira saga, tupã, palavra de origem tupi que significa “início” ou “começo”.

Mas não! Pensei um pouco e não!

Sabem porquê, por que nunca sabemos aonde começou, e onde terminará, comecei tudo isso, porque queria ter uma vida mais saúdavel, mais equilibrada, aprendi a correr, virei fã do autor, sou encantado pelo sertão, e por ai vai!

Então, nunca sei qual de fato onde seria o começo, e nem vejo fim para nada, apenas recomeços! Por isso, Sagarana seja mais adequado diante todas as coincidências, ou circunstâncias é melhor manter!

Que venham mais conexões!

Da minha jornada, alguns números. Uma rota que liga o aeroporto de Confins à Brasilia, por terra, passando por todos os lugares que o autor passou durante a jornada da Boiada, ou que ele cita em suas obras, todos devidamente georreferenciados, totalizando uma rota linear de 1450 km. Passando por 15 cidades, 23 estados e o distrito federal, conheci e convivi, com mais de 200 pessoas diretamente, pela primeira vez! Gente do sul, sudeste, norte, nordeste, centro-oeste, quilombos, com-terras, injustiças, vitórias, lagrimas, sorrisos, histórias de todo tipo, empresários, artistas, músicos, poetas, fazendeiros, sertanejos, gente de todo tipo e todo canto, histórias que levariam vidas para contar, igual, nunca mais!

Passei por 8 parques florestais, hospedei em 1. Cruzei pelo mesmo rio, em um dia 22 vezes! Veredas? Nadei em 2 veredas e em 3 rios diferentes. Cruzei por dezenas, mas uma, eu andei ao seu lado por 13 km! Rodei 4.500 km sozinho no meu carro! Dormi em barraca 12 dias e no saco de dormir 14 vezes! Fui a 4 festas tradicionais sertanejas e participei de 5 rodas de viola! Fiquei no entorno da fogueira 8 vezes! Arroz, tutu de feijão levemente apimentado, com frango caipira assado e salada de alface com tomate e coentro, talvez seja a melhor comida que comerei no ano!

Posso contar nos dedos, os dias que não vi o pôr-do-sol, assim como foi rotina, ver ele indo embora, no tempo que é dele, quase todo dia!

Disso tudo, tenho saudade, preciso agora, seguir, e entender tudo isso, com o Sagarana, caminhando!